Contratação Integrada: auditoria do TCU expõe a ponta do iceberg

Por Carlos Roberto Soares Mingione, presidente do Sinaenco/SP

Dois anos e meio depois da publicação do Dossiê sobre os resultados da Contratação Integrada nas licitações do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), elaborado pelo Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco) em parceria com o Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), o relatório de uma auditoria do TCU, publicado pelo tribunal em fevereiro último, confirma os resultados anteriormente divulgados.

Os dois trabalhos tiveram metodologias semelhantes, pois promoveram a comparação de processos licitatórios realizados na modalidade da Contratação Integrada com outras modalidades previstas na legislação vigente.

A Contratação Integrada é um dos regimes de execução indireta de obras e serviços de engenharia, previstos no Regime Diferenciado de Contratação (RDC). Nas licitações regidas por este regime, o licitante elabora sua proposta com base em um anteprojeto, documento técnico desprovido de informações indispensáveis para possibilitar a adequada especificação do objeto da contratação e, consequentemente, ineficaz para o controle da qualidade da obra a ser construída, do seu prazo de execução, bem como dos custos envolvidos na implantação, operação e manutenção do bem público em questão. Em todas as demais modalidades licitatórias o projeto básico é reconhecido como o documento indispensável para deflagrar o processo de contratação.

Dentre os resultados do dossiê Sinaenco-CAU/BR, que foram corroborados pela auditoria do TCU, destacam-se:

–   Os descontos médios ofertados nos processos de Contratação Integrada foram inferiores aos propostos nas demais modalidades licitatórias;

–   O percentual de processos licitatórios fracassados é significativamente maior quando utilizado o regime da Contratação Integrada;

–   As licitações regidas pelo RDC/Contratação Integrada apresentaram os maiores prazos licitatórios;

–   A grande quantidade de falhas em anteprojetos, utilizados no regime da Contratação Integrada, indica que as especificações contidas nestes documentos técnicos não parecem estar atendendo à satisfação do interesse público;

–   É possível a ocorrência de conflito de interesses na elaboração dos projetos básicos e executivos.

Decorridos quase seis anos da instituição no Brasil da modalidade Contratação Integrada, ainda não puderam ser confirmadas as principais vantagens alegadas pelos seus defensores.

A auditoria do TCU registrou, também, que há indícios de que a Contratação Integrada esteja sendo utilizada em processos em que seu uso não se justifica, ou mesmo nos quais haja inviabilidade da sua adoção. E, também, que há sinais de irregularidades nos projetos básicos e executivos desenvolvidos na Contratação Integrada, com alterações no objeto da obra, podendo conduzir a qualidades inferiores às desejáveis no objeto contratado.

Decorridos quase seis anos da instituição no Brasil da modalidade Contratação Integrada, ainda não puderam ser confirmadas as principais vantagens alegadas pelos seus defensores, tais como a redução dos preços contratados, a diminuição dos prazos de execução das obras e a eliminação dos aditivos dos preços contratados e dos prazos estipulados. Mas já se avolumam os resultados negativos, que podem ser verificados nas seguintes obras: VLT de Cuiabá (MT), Aeroporto Internacional Pinto Martins (Fortaleza–CE), corredor estruturante Aeroporto-Arena das Dunas (Natal–RN), BR-381 – Trecho Governador Valadares–Belo Horizonte (DNIT), Refinaria Abreu e Lima (PE), BR-163/PA (DNIT), somente para citar alguns exemplos.

Até o momento, pode-se afirmar que está exposta apenas a ponta do iceberg e, infelizmente, ao cabo de mais alguns anos, poderemos descobrir da pior maneira possível o erro cometido, quando explodir o número de empreendimentos fracassados, ou quando verificarmos a ocorrência da redução da qualidade e da eficiência de bens produzidos, e, consequentemente, constatarmos o aumento dos custos de operação e manutenção, bem como a redução da vida útil dos empreendimentos em questão.

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