ENTREVISTA: Monica Porto, secretária-adjunta de Saneamento e primeira mulher a receber prêmio de Engenheiro do ano

Secretária-adjunta de Saneamento e Recursos Hídricos do Governo do Estado de São Paulo, Mônica receberá premiação concedida pelo Instituto de Engenharia na próxima semana.

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Primeira mulher a receber o título de Eminente Engenheiro do Ano de 2016, premiação anual concedida pelo Instituto de Engenharia de São Paulo, a engenheira Mônica Ferreira do Amaral Porto tem uma trajetória acadêmica e profissional que faz jus à homenagem. Ela é secretária-adjunta de Saneamento e Recursos Hídricos do Governo do Estado de São Paulo. Professora-Titular da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Epusp) na área de Engenharia Ambiental,obteve seus títulos de mestrado, doutorado e livre-docência na Epusp. Foi diretora-presidente da Fundação Centro Tecnológico de Hidráulica; foi também chefe do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Epusp e presidente da Associação Brasileira de Recursos Hídricos.

Nesta entrevista, Mônica Porto fala sobre a importância do prêmio, da presença das mulheres em campos antes restritos aos homens e sua visão sobre o s desafios do setor de recursos hídricos.

Como vê a importância de ter recebido o Prêmio Engenheiro do Ano de 2016 do Instituto de Engenharia, a primeira engenheira a receber essa homenagem nos 100 anos de história do Instituto?

Sinto-me muito honrada por ter sido agraciada com um prêmio tão importante, ainda mais no ano em que esta tradicional instituição celebra seu centenário. Também me orgulha muito receber um prêmio que, no passado, contemplou o Prof. Lucas Nogueira Garcez, governador do Estado de São Paulo e respeitado engenheiro, pioneiro do setor de água. Vejo nesta minha premiação não só o reconhecimento da dedicação à carreira, mas também da importância da área em que atuo, que é o setor de recursos hídricos.

Vejo nesta minha premiação não só o reconhecimento da dedicação à carreira, mas também da importância da área em que atuo, que é o setor de recursos hídricos.

As mulheres vêm se destacando num campo que até poucas décadas era quase exclusivamente masculino, a engenharia. Em sua opinião, como professora e profissional experiente e destacada, quais são os principais fatores que influenciaram essa crescente presença feminina nas diversas áreas da engenharia?

Acredito que a presença feminina observada hoje em campos como a engenharia represente as mudanças ocorridas na minha geração, com mais liberdade de escolha da carreira e das opções de vida. Em paralelo, é muito importante reconhecer que existem diferenças, seja de gênero, ou de opinião, entre muitas outras, e respeitá-las. A diversidade enriquece e acredito que todos nós ganhamos muito com isso nos ambientes profissional e acadêmico.

Como profissional que construiu sólida carreira acadêmica e ocupando relevante cargo público em sua área de atuação, qual a sua visão sobre a atual situação do setor de saneamento e recursos hídricos em São Paulo e no Brasil?

Devemos reconhecer que, apesar dos avanços, o Brasil tem uma lacuna importante no setor de saneamento. O déficit de saneamento no país é grave e atinge mais seriamente as populações de menor renda e mais frágeis. O Estado de São Paulo tem posição de destaque e apresenta os melhores indicadores do país, mas, ainda assim, há muito por fazer. O desafio não está somente na tecnologia, mas também na capacitação técnica das instituições e nas alternativas de financiamento. É muito comum, por exemplo, encontrarmos municípios pequenos que não tem ao menos um engenheiro em seu quadro. É difícil nesta situação dar boas soluções a problemas de saneamento, drenagem, habitação, sistema viário, resíduos sólidos, e tantos outros para os quais o engenheiro está apto a colaborar.

São Paulo e o país vivem, de tempos em tempos, crises hídricas de relativa gravidade. Quais são os principais desafios a serem enfrentados nesta e nas próximas décadas no país?

O setor de recursos hídricos enfrenta hoje um conjunto grande de novos desafios advindos da dificuldade de enfrentar as incertezas da variabilidade climática face a um mundo que caminha para 9 bilhões de pessoas em 2050, com a grande maioria vivendo concentrada em grandes áreas urbanas. Além da garantia do abastecimento público de qualidade, com regularidade e isonomia, ainda há a necessidade do suprimento que garanta a agricultura, a indústria e a geração de energia. Isso tudo sem contar a necessidade premente de controle da poluição das águas. Novas tecnologias que permitam a redução do consumo, a reciclagem e reuso de água, processos em ciclo fechado e tantas outras que ainda virão, serão obrigatoriamente parte importante da profissão da engenharia. A correta gestão, com o compartilhamento adequado entre os usos, a necessidade de um arsenal de instrumentos que vão desde o desafio do planejamento sob incerteza climática, até a aplicação de instrumentos econômicos que tragam conformidade ao uso adequado do recurso, são os novos desafios que as múltiplas disciplinas envolvidas no setor de recursos hídricos terão de enfrentar. E, por último, mas talvez o mais desafiador, é a questão da mobilização de investimentos para fazer face a tal tarefa. O grande crescimento populacional e urbano se dará nos países mais pobres, com baixa renda, e, para um mundo justo e igualitário, com qualidade de vida para todos, há que se criar formas globais de se garantir esse investimento.

Qual a mensagem que a senhora gostaria de transmitir às atuais e futuras gerações de engenheiros e engenheiras brasileiros?

Abrace a profissão. O país precisa de profissionais dedicados e treinados para resolver problemas. Envolva-se com problemas reais, mantenha-se atualizado com as novas tecnologias, reconheça a multidisciplinaridade da engenharia. E como professora, digo: estude. Vale cada segundo assim investido.